Maio 2009


Militar luso-brasileiro (Faro, 11 de Setembro de 1767 – Rio de Janeiro, 2 de Agosto de 1836). Foi governador de Elvas e era primeiro-tenente de Artilharia de Faro quando partiu para a Baía. Comandou as tropas que submeteram o Uruguai e ocuparam Montevideu (1817). Aquando da independência do Brasil, pôs-se ao lado de D. Pedro, tendo também tomado como sua a vontade de ver o Brasil independente. Comandou o Exército até à independência do Uruguai (1828) na Guerra Cisplatina. Em 1832, tornou-se marechal. Foi membro do conselho de D. João VI e foi agraciado com a grã-cruz da Ordem de Sant’Iago, tendo obtido as medalhas militares da Guerra Peninsular e a Estrela de Ouro do Rio da Prata. Foi barão de Laguna.

(via “História de Portugal – Dicionário de Personalidades” (coordenação de José Hermano Saraiva), edição QuidNovi, 2004)

Marinheiro (séculos XV e XVI). Foi o primeiro capitão-mor das armadas enviadas ao Brasil destinadas a defender a costa contra os piratas estrangeiros. Na primeira expedição (1516-1519) esteve no rio da Prata e, na segunda, já em 1526-1529, aprisionou barcos franceses que carregavam pau-brasil de forma abusiva.

(via “História de Portugal – Dicionário de Personalidades” (coordenação de José Hermano Saraiva), edição QuidNovi, 2004)

A Enciclopédia Virtual da Expansão Portuguesa é um projecto desenvolvido pelo Centro de História de Além-Mar unidade de investigação interuniversitária, da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e da Universidade dos Açores, que pretende disponibilizar a todos os interessados conteúdos multimédia de natureza científica, educativa e cultural sobre a temática dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa.

A Enciclopédia Virtual da Expansão Portuguesa destina-se a um público vasto, dentro e fora de Portugal, incluindo alunos do ensino secundário, estudantes e investigadores do meio universitário, profissionais da comunicação social e todos os interessados em História dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa.

A Enciclopédia Virtual da Expansão Portuguesa disponibiliza artigos, imagens, mapas, cronologias e genealogias, de carácter sintético, mas dotados de grande fiabilidade científica, encontrando-se em permanente ampliação e actualização. Tais materiais são produzidos por professores e investigadores do meio académico, e validados por uma Comissão Científica composta pelos mais reputados historiadores nacionais e estrangeiros. O projecto abrange uma vasta área geográfica, que vai desde os Açores até ao Japão, e um intervalo de tempo compreendido entre o início do século XV e o final do século XVIII.

O carácter bilingue da Enciclopédia Virtual da Expansão Portuguesa pretende torná-la num incontornável meio para a divulgação internacional da história e da historiografia da presença portuguesa no mundo, ainda que, por razões de ordem técnica, o ritmo da tradução para a língua inglesa não possa estar a par da colocação em linha das entradas redigidas em Português e vice-versa. Sublinha-se o carácter nacional da empresa expansiva portuguesa, mas também a sua inserção numa quadro europeu mais vasto e a sua importância para uma nova consciência europeia emergente, suspensa hoje entre a crítica e a apologia do processo expansivo Ocidental.

Princesa regente do Brasil (Rio de Janeiro, 29 de Julho de 1846 – Castelo d’Eu, França, 14 de Novembro de 1921). Filha de D. Pedro II e de D. Teresa Cristina Maria de Bourbon, foi educada para governar (os dois irmãos varões morreram na infância). Inteligente e virtuosa, foi também uma noiva apaixonada. Em 1864, casou-se com Luiz Filipe Gastão Orleans, conde d’Eu. No entanto, a felicidade da princesa foi esmorecendo, por não conseguir herdeiros. Submeteu-se a vários tratamentos, sem que os resultados surgissem. A certa altura, em 1868, acompanhada do conde d’Eu, resolveu experimentar um tratamento com as águas minerais de Caxambu, em Minas Gerais. Depois de lá ter permanecido durante algum tempo, regressou à corte mais alegre e de esperanças. Se foi aquela a cura ou não, não se sabe. O certo é que teve três robustos varões. Entretanto, bem antes do que estava à espera, aquando das prolongadas viagens do imperador seu pai, foi regente por três vezes, de 1871 a 1872, de 1876 a 1877 e de 1887 a 1888. Períodos curtos, mas que chegaram para deixar o seu nome para sempre associado à história do Brasil devido às medidas que tomou. Assinou a Lei do Ventre Livre, que libertou os filhos dos escravos, e, em 1888, a Lei Áurea, que extinguiu a escravidão negra no Brasil. Como consequência desta medida, recebeu o cognome de a Redentora. Entre várias distinções, foi-lhe concedida a Ordem de Santa Isabel, de Portugal. Com a queda do regime monárquico, acompanhou a família no exílio.

(via “História de Portugal – Dicionário de Personalidades” (coordenação de José Hermano Saraiva), edição QuidNovi, 2004)

Comandante holandês (Delfshaven, 1577-1629). Foi prisioneiro dos espanhóis, juntamente com o pai. Andou pelos mares do Oriente e do Mediterrâneo, contudo, foi nas águas do Atlântico que se destacou, na zona do Brasil. Célebres foram as suas expedições no Brasil, em Angola e nas Antilhas (neste caso contra os espanhóis).

(via “História de Portugal – Dicionário de Personalidades” (coordenação de José Hermano Saraiva), edição QuidNovi, 2004)

Fernão de Magalhães, o navegador da circum-navegação, nasceu em Sabrosa, diz a Wikipedia. Falso, diz o nosso convidado de hoje. Para outros, Magalhães nasceu no Porto. O nosso convidado rebate esses argumentos e anuncia que a questão da naturalidade do explorador está resolvida: foi em Ponte da Barca!

Amândio Barros doutorou-se em história pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, sendo actualmente investigador no CITCEM da Universidade do Porto. Ganhou vários prémios devido aos seus estudos sobre os Descobrimentos.

«Curiosamente, o historiador começou o seu trabalho de investigação deste tema a convite da Câmara de Sabrosa», mas, entretanto, descobriu que a documentação em que se fundamentaria a hipótese de ter sido Sabrosa o berço de Fernão Magalhães, apresentada por alguém que tentava assim herdar a fortuna do navegador, é falsa.

(Em debate, hoje, das 15 às 16 horas, na TSF, no programa “Mais cedo ou mais tarde“, de João Paulo Meneses).

O INFANTE D. HENRIQUE E A UNIVERSIDADE

Comemoramos este ano os 600 anos do nascimento do Infante D. Henrique. Esta efeméride obriga-nos a prestar uma atenção especial a esta personagem, ao homem que ficou na História como o impulsionador e responsável pelo arranque dos Descobrimentos Portugueses. É, de facto, esta a faceta mais conhecida do Infante D. Henrique, aquela que surge referida nos manuais de História. Porém, o Centenário do seu nascimento é uma boa ocasião para irmos um pouco mais além, para conhecermos um pouco melhor outros aspectos da sua biografia e da sua acção a outros níveis. Vamos hoje falar do Infante D. Henrique enquanto protector da Universidade de Lisboa, referindo a sua acção decisiva em prol da instituição e assinalando o papel decisivo que desempenhou na reforma universitária.

A Universidade havia sido criada em 1290 por D. Dinis, sob a designação de Estudos Gerais, tendo ficado sediada em Lisboa. Durante o século seguinte mudaria várias vezes de sede, oscilando entre a capital e Coimbra. De facto, a instituição enfrentava grandes dificuldades, e só a custo conseguiria sobreviver e transformar-se numa verdadeira Universidade. Foi o rei D. Fernando quem deu o primeiro grande impulso, ao fixá-la de vez em Lisboa e ao proceder a importantes reformas e melhoramentos, nomeadamente na sua organização e jurisdição, melhorando a qualidade de ensino ao promover a vinda de professores qualificados de várias universidades estrangeiras, mas sobretudo ao providenciar boas instalações para a Universidade, garantindo também alojamentos para professores e estudantes. Na crise de 1383-85, a instituição desempenha um importante papel, pois o futuro D. João I rapidamente compreendeu a importância de ganhar o apoio da Universidade para a sua causa. Logo em 1384 concede-lhe uma série de importantes privilégios; em troca, conta com o apoio de vários legistas, entre os quais o de mestre João das Regras, que defendeu a causa do Mestre de Avis nas Cortes de Coimbra. Ganha a guerra com Castela, assegurada definitivamente a posição da dinastia de Avis no trono de Portugal, o novo rei amplia os privilégios e procede a diversas reformas na Universidade, de modo a eliminar de vez os velhos problemas e deficiências da instituição e a equipará-la ao níveis das melhores universidades da Europa. Uma das medidas que tomou foi destacar alguém de sua inteira confiança para tratar dos assuntos referentes á Universidade, criando o cargo de “Protector dos Estudos de Portugal”. Foi este cargo que o Infante D. Henrique desempenhou durante boa parte da sua vida, e que selaria a sua ligação ao mundo académico.

Não se conhece a data exacta em que o Infante D. Henrique foi nomeado Protector da Universidade. Sabe-se, sim, que, tal como o seu irmão D. Pedro, desde cedo se mostrou interessado nos problemas da reforma académica. É provavelmente a partir de 1431, data em que se promulgam os Estatutos da Universidade, que o Infante toma a seu cargo a condução da instituição, exercendo uma profunda influência que duraria até á sua morte em 1460. De facto, é com o Infante D. Henrique que o Estudo Geral de Lisboa se torna uma verdadeira Universidade. Os estatutos aprovados naquele ano de 1431 definem com clareza a forma e o conteúdo da vida académica, como seja os graus concedidos, o número e a duração dos cursos, as formas de avaliação e os juramentos que cada graduado deveria efectuar, assim como algumas regras de conduta a cumprir, de que apresentamos um pequeno excerto abreviado do documento em latim:

“Os mestres e doutores deverão apresentar-se nas aulas e nos actos escolares com os trajes doutorais; leitores, licenciados e bacharéis em traje próprio, pelo menos até aos calcanhares; os demais também em traje próprio, pelo menos até ao meio da perna. Que nenhum escolar tenha em sua casa cavalo, jumento, cães, aves de caça ou, permanentemente, mulher duvidosa. Caso contrário, não desfrutará os privilégios do Estudo.”

A Universidade era nesse tempo bem diferente da dos nossos dias. O ensino estava associado á Igreja, cujos rendimentos suportavam as despesas da Universidade. Esta dependia assim em grande parte do Papa, sobretudo no que toca ás matérias a ensinar. Por exemplo, o curso de Teologia estava dependente de autorização papal, e só com o ensino desta matéria é que o Estudo Geral de Lisboa se tornava uma verdadeira Universidade. Embora o Papa tenha dado o seu consentimento ainda antes do ano de 1400, acontece que os custos que tal curso acarretava impossibilitaram durante vários anos a sua efectivação. Só em 1448, e graças ao Infante, é que tal foi possível, e portanto só neste ano é que a Universidade podia ser assim chamada. Para tal D. Henrique disponibilizou parte dos rendimentos que recebia da ilha da Madeira, cuja continuidade ficou garantida no seu próprio testamento. Tomou também algumas medidas no sentido de aumentar as fontes de rendimento da Universidade, de forma a garantir algum desafogo financeiro. Conseguiu, assim, anexar ao Estudo Geral os rendimentos de várias igrejas, e estipulou em algum casos o pagamento de propinas.

A acção do Infante D. Henrique não se limitou á mera questão financeira. De facto, sabemos que manifestava uma grande preocupação com a qualidade do ensino e com as suas condições, acompanhando de perto a resolução dos problemas existentes. Em primeiro lugar, dotou a Universidade de casas próprias, de modo a evitar futuros problemas de instalações e de alojamentos para os professores e estudantes. Depois, aperfeiçoou o controle dos funcionários sobre as situações irregulares, de modo a assegurar o bom funcionamento do ensino. Por exemplo, toma conhecimento que alguns professores (que se chamavam na época lentes) recebiam o ordenado mas faltavam frequentemente, pelo que ordena o seguinte:

“O dia em que o lente não ler, seja-lhe descontado, se substituto não puser; e se o quiser pôr, mando que o ponha com consentimento dos escolares e aja a metade do salário, e não mais”.

O problema da ligação entre o saber teórico e livresco que se ensinava nas universidades e o saber prático de navegação que os portugueses ampliavam na época, igualmente sob orientação do mesmo Infante, é algo que se discute ainda hoje em dia. Sabe-se que a famosa Escola de Sagres não foi uma escola no sentido estrito do termo, mas sim a designação do conhecimento prático de navegação, astronomia e cartografia lentamente desenvolvido pelos marinheiros portugueses. De uma maneira geral, aceita-se que o que se aprendia nas universidades de pouco ou nada servia para as viagens de descobrimento, pois estas resultavam da prática dos homens do mar e da resolução dos problemas concretos, e não de velhas ideias, muitas vezes erradas, transmitidas pelos geógrafos da Antiguidade. As viagens de Descobrimento resultavam assim de verdadeiros conhecimentos e tecnologias “de ponta” e não do saber livresco. Porém, alguns historiadores conseguem detectar uma ligação entre as duas esferas, do seguinte modo: sob orientação do Infante foram introduzidas novas cadeiras na Universidade, que curiosamente se ligam de algum modo com as viagens de descobrimento: Aritmética, Geometria e Astrologia. Porém, embora tal facto fosse provavelmente mais do que uma simples coincidência, a verdade é que o Infante sabia, ou veio mais tarde a aperceber-se que o futuro dos Descobrimentos estava nas mãos dos marinheiros de Lagos e não dos estudantes e professores de Lisboa.

Paulo Jorge de Sousa Pinto – texto de apoio a programas de rádio sob a designação “Era uma vez… Portugal”, emitidos entre 1993 e 1996 pela RDP-Internacional, em associação com a Sociedade Histórica da Independência de Portugal

Missionário no Brasil (Lisboa, 1523? – Olinda, 1609). Jesuíta, foi reitor do Colégio de Jesus de Coimbra. No Brasil desde 1553, foi provincial (1560-1570), reitor dos Colégios da Baía (1574-1575) e de Olinda (1577-1589). Ficou célebre o seu Diálogo da Doutrina Cristã para Uso das Escolas ou Suma da Fé.

(via “História de Portugal – Dicionário de Personalidades” (coordenação de José Hermano Saraiva), edição QuidNovi, 2004)

Tomé Pires e a Primeira Embaixada Europeia à China

Portugal pode orgulhar-se de ter descoberto novas terras, desbravado novos caminhos e trilhado pela primeira vez diversas rotas marítimas. Este fim de milénio é propício á comemoração de diversos feitos praticados pelos nossos antepassados há quinhentos anos; mesmo agora, em 1993, nunca é demais referir o facto de se comemorar os 450 anos da chegada dos portugueses ao Japão. Mas quanto á vizinha China, Portugal não tem assinalado devidamente a presença portuguesa no século XVI. Quando se fala na China, surge-nos geralmente o nome de Marco Polo, como autor da grande divulgação deste país na Europa nos finais da Idade Média. O que, por vezes, esquecemos, é que a primeira embaixada europeia á China foi portuguesa, levada a cabo por um homem singular, chamado Tomé Pires. É deste português, da sua vida e da sua missão no Império do Meio que vamos falar hoje.

Tomé Pires nasceu em Lisboa, onde viveu a maior parte da sua vida. O seu pai era boticário do rei D. João II, e Tomé, naturalmente, aprende desde cedo as artes e os conhecimentos da profissão. Tal foi o seu desempenho que conseguiu, com pouco mais de 20 anos, tornar-se o boticário do príncipe D. Afonso. Várias vicissitudes da sua vida levaram-no a partir, em 1511, para a Índia, onde os portugueses consolidavam posições e ampliavam consideravelmente os seus domínios. Durante alguns anos visita várias cidades, nomeadamente Malaca, recém-conquistada por Afonso de Albuquerque e que abriu aos portugueses as portas do Extremo Oriente. É aqui que escreve uma descrição do Oriente, uma obra ímpar de rigor, seriedade e veracidade, a que chamou Suma Oriental, e que é hoje um livro extraordinário para o estudo quer dos portugueses no Oriente, quer das civilizações asiáticas.

Porém, Tomé Pires nunca sairia do anonimato se não tivesse sido a sua nomeação para chefiar a embaixada que o rei D. Manuel havia ordenado que se enviasse ao grande império da China, para estabelecer relações de amizade e acordos de comércio. A sua educação e diplomacia, a sua seriedade e rigor, para além dos excelentes conhecimentos botânicos, tornavam-no no homem ideal para conduzir a bom termo esta empresa arriscada. Pires parte, assim, para a China, chegando á costa chinesa em Agosto de 1517. É bem recebido por uma armada chinesa, seguindo para Cantão. Aqui começam os problemas. Os portugueses, como outros povos, tinham como hábito e sinal de amizade fazer uma saudação, ao chegarem a um porto, com tiros de canhão. Na China, porém, isto foi encarado como uma ofensa e sinal de falta de respeito, lançando dúvidas aos chineses sobre as intenções dos estrangeiros. Após negociações, o assunto é resolvido, recebendo então Pires autorização para desembarcar, o que faz do seguinte modo:

“[desembarcou] no cais de pedra, com grande estrondo de artilharia e trombetas, e a gente vestida de festa, ele e sete portugueses, que ficaram em sua companhia para irem com ele a esta embaixada, foram levados a seus aposentos, que eram umas casas das mais nobres que havia na Cidade.”

Estes primeiros contactos foram coroados de êxito, demonstrando os funcionários chineses grande entusiasmo em preparar a viagem do embaixador a Pequim, onde entregaria cartas do rei D. Manuel e presentes ao Imperador. Porém, Pires terá que esperar até 1520, quando recebe finalmente autorização para avançar para Pequim. Entretando, os navios portugueses haviam regressado já a Portugal, contando a D. Manuel o sucedido e o bom prosseguimento da missão.

Chegado a Pequim, estabelece então os contactos com a Corte e o Imperador. A embaixada de Tomé Pires acabará por falhar, devido a uma infeliz série de acasos desfavoráveis aos portugueses. Em primeiro lugar, as dificuldades provocadas pela língua dificultavam e, por vezes, impediam mesmo a comunicação e o esclarecimento de mal-entendidos. Por exemplo, o imperador da China tinha cartas dos seus governadores de Cantão que diziam que o rei português D. Manuel estava disposto a declarar-se vassalo da China, o que, evidentemente, era falso, e que causou alguns dissabores a Tomé Pires. Depois, começavam a chegar todo o tipo de queixas, reais ou inventadas, sobre abusos e roubos feitos pelos portugueses. Sobre isto diz o cronista João de Barros:

“(…) diziam que comprávamos moços e moças furtadas, filhos de pessoas honradas, e que os comíamos assados, as quais coisas eles criam ser assim, porque de gente que nunca tiveram notícia, e éramos terror e medo a todo aquele Oriente”.

A má fama dos portugueses cresce, de facto, durante este tempo, comprometendo de vez o sucesso da embaixada. Outro factor desfavorável ocorreu ainda: o sultão de Malaca, que os portugueses haviam expulso aquando da conquista da cidade, declarara-se vassalo do Imperador da China, e vinha agora fazer campanha contra os portugueses, acusando-os de serem ladrões e piratas. Finalmente, o Imperador havia tratado os portugueses com cortesia, perdoando o seu desconhecimento das regras de etiqueta chinesa, mas a sua morte neste tempo veio abrir caminho aos funcionários chineses, que desde cedo se haviam mostrado avessos aos portugueses. Assim, recusam os presentes que Pires pretendia oferecer, e mandam embora a embaixada, preparando a sua destruição. Quando os portugueses chegam a Cantão são presos, e os navios dos que os esperavam, atacados e destruídos. É exigida a entrega de Malaca em troca do embaixador e dos seus homens. Assim, todos os portugueses, á excepção de Pires e de um companheiro, são condenados á morte sob acusação de serem ladrões. Quanto a Tomé Pires, nada mais se sabe de concreto. Fernão Mendes Pinto, que por lá passou mais de vinte anos depois, diz ter encontrado uma mulher cristã que lhe disse chamar-se Inês de Leiria, orfã, e ser filha de Tomé Pires. Diz também que encontrou um homem velho que lhe disse o seguinte:

“Sou (…) um pobre cristão português, por nome Vasco Calvo, (…) que agora faz vinte e sete anos que nesta terra fui cativo com Tomé Pires, que Lopo Soares mandou a este Rei china, que depois acabou desastradamente por um desarranjo de um capitão português”.

Assim, é possível que Tomé Pires tivesse sido exilado de Cantão, e não tivesse sofrido a mesma sorte dos seus companheiros. Se as contas de Fernão Mendes Pinto estão correctas, então terá morrido cerca de 1540. De qualquer modo, o fracasso da sua missão atrasou em cerca de trinta anos o estabelecimento de relações entre Portugal e a China, sendo durante este tempo interdita a entrada de portugueses no território chinês. A fixação dos portugueses em Macau coroou definitivamente o relacionamento entre chineses e portugueses que agora, passados quatro séculos e o período dos Descobrimentos, Portugal devolveu de vez á China em 1999.

Paulo Jorge de Sousa Pinto – texto de apoio a programas de rádio sob a designação “Era uma vez… Portugal”, emitidos entre 1993 e 1996 pela RDP-Internacional, em associação com a Sociedade Histórica da Independência de Portugal

Navegador e colonizador (?-1556), em 1530 aportou ao Brasil. Explorou o rio da Prata, onde implantou um padrão. Instituídas as capitanias hereditárias, recebeu em 1536 a de São Tomé (estado do Rio de Janeiro), e nela fundou a vila da Rainha. Sob as suas ordens, o mato foi desbravado, iniciando-se o cultivo de cana-de-açúcar. Mais tarde, seria hostilizado pelos índios e obrigado a refugiar-se como os colonos nas capitanias vizinhas, apenas regressando depois de ser reposta a soberania portuguesa na região. Em 1556 partiu para a Índia, onde morreu em combate.

(via “História de Portugal – Dicionário de Personalidades” (coordenação de José Hermano Saraiva), edição QuidNovi, 2004)

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