Descoberta do Brasil


Todavia, ao longo das três décadas seguintes, a descoberta do Brasil pouco alteraria nas prioridades estratégicas portuguesas, que continuavam orientadas, quase em exclusividade, para a Índia.

E só quando essa opção começou a mostrar sinais de “esgotamento”, é que o Brasil passaria a ser visto não apenas como uma mera descoberta fortuita no âmbito da vasta empresa dos Descobrimentos – até então utilizado como um ponto de escala no caminho para a rota do Cabo -, vindo a assumir gradualmente posição de charneira da expansão ultramarina portuguesa.

Apenas a partir do final de 1530, com a expedição organizada por Martim Afonso de Sousa, compreendendo cerca de 400 povoadores – tendo nomeadamente por objectivos vigiar a costa brasileira e expulsar os corsários franceses, reconhecer a costa (desde o Amazonas até ao Rio da Prata), marcando a soberania portuguesa em vários locais, assim como procurar vestígios de metais preciosos –, se daria efectivo início à colonização da nova terra descoberta, por via de um processo de povoação, exploração e controlo do território, com a fundação, em 1532, de duas vilas: a de S. Vicente, na costa (na qual seria construído, em 1533, o primeiro engenho de açúcar na América portuguesa) e, um pouco no interior, junto ao rio Piratininga, aquela que viria posteriormente a ser chamada S. Paulo.

Até que, em 1549, chegaria ao território Tomé de Sousa – acompanhado dos jesuítas –, assumindo o cargo de primeiro governador-geral do Brasil, sendo o responsável pela fundação da cidade de Salvador, novo centro político-administrativo do território.

Bibliografia consultada

– “A Viagem do Descobrimento – A Expedição de Cabral e o Achamento do Brasil”, de Eduardo Bueno, Editora Pergaminho, 2000
– “Os Descobrimentos Portugueses”, de Luís de Albuquerque, edição das Selecções do Reader’s Digest, 1985
– “O Achamento da Terra de Vera Cruz”, de Jorge Couto, Camões – Revista de Letras e Culturas Lusófonas, número 8, Janeiro-Março de 2000

D. Manuel terá tomado conhecimento da boa nova já no mês de Julho, tendo contudo optado – no âmbito da gestão das relações com Castela – por manter sigilosa a descoberta, num período em que era conhecida a notícia do falecimento do jovem príncipe herdeiro dos tronos de Castela, Aragão e Portugal, D. Miguel da Paz – que se esperara viesse a concretizar a união ibérica sob um monarca português -, e em que o Rei português, ainda sem descendência, tratava do seu casamento com a infanta D. Maria, filha dos Reis Católicos, realizado no final de Outubro de 1500.

Apenas no início de 1501 os novos domínios começariam a ser publicamente integrados no Império português, com as primeiras expedições exploratórias do território (comandadas por João da Nova, na terceira armada com destino à Índia, em Março, e por Gonçalo Coelho, partindo de Lisboa em Maio, visando conhecer a sua delimitação).

Somente no final de Agosto – cerca de um ano decorrido após dela ter tido conhecimento – D. Manuel terá informado os Reis Católicos, agora já seus sogros, da descoberta…

Bibliografia consultada

– “A Viagem do Descobrimento – A Expedição de Cabral e o Achamento do Brasil”, de Eduardo Bueno, Editora Pergaminho, 2000
– “Os Descobrimentos Portugueses”, de Luís de Albuquerque, edição das Selecções do Reader’s Digest, 1985
– “O Achamento da Terra de Vera Cruz”, de Jorge Couto, Camões – Revista de Letras e Culturas Lusófonas, número 8, Janeiro-Março de 2000

Não são também concordantes as opiniões dos autores dos relatos sobre o achamento no que concerne à natureza da terra descoberta: considerada como uma ilha por Pêro Vaz de Caminha (conforme datou a carta enviada ao rei); enquanto o mestre João referia que «quase entendemos por acenos que esta era ilha, e que eram quatro, e que de outra ilha vêm aqui almadia»; por fim, o autor da geralmente designada “Relação do Piloto Anónimo” não é taxativo, fazendo menção a que a terra descoberta era «grande, porém não pudemos saber se era ilha ou terra firme», inclinando-se não obstante para a segunda possibilidade, dado o seu tamanho (beneficiando do facto de, tendo prosseguido viagem para sul, ter avistado uma mais extensa parcela da faixa costeira).

Com esta viagem de Pedro Álvares Cabral, pode dizer-se que terminavam os Descobrimentos portugueses, após ter sido alcançado já – ainda no final do século XV – o principal objectivo, a rota das especiarias.

Passava então a ser determinante o controlo sobre a via recém-descoberta, a chamada «rota do Cabo», e o domínio das linhas de navegação com confluência em Calecute.

Os descobrimentos subsequentes (por exemplo, a ilha de Santa Helena ou as ilhas de Tristão da Cunha, ambas no Atlântico Sul) passaram a ser ocasionais, decorrendo essencialmente da opção por vias mais favoráveis, seguida por navegadores.

Bibliografia consultada

– “A Viagem do Descobrimento – A Expedição de Cabral e o Achamento do Brasil”, de Eduardo Bueno, Editora Pergaminho, 2000
– “Os Descobrimentos Portugueses”, de Luís de Albuquerque, edição das Selecções do Reader’s Digest, 1985
– “O Achamento da Terra de Vera Cruz”, de Jorge Couto, Camões – Revista de Letras e Culturas Lusófonas, número 8, Janeiro-Março de 2000

A carta do achamento, da autoria de Pêro Vaz de Caminha, seria datada de «Porto Seguro, da vossa ilha da Vera Cruz, hoje, sexta-feira, primeiro dia de Maio de 1500», dia em que, como numa procissão, erguendo os estandartes da Ordem de Cristo, mais de mil homens seguiram em fila pelas margens do rio Mutari, para fincar a grande cruz (de cerca de sete metros), celebrando-se então, pela segunda vez, missa, com os índios a assistir e a erguer as mãos, replicando os movimentos dos portugueses.

No dia seguinte, sábado, 2 de Maio, a frota zarpava em demanda do cabo da Boa Esperança, rumo à Índia.

Na carta que enviou a D. Manuel I, o mestre João Faras (cosmógrafo e físico régio) informava o monarca de que, para conhecer a localização da nova terra, bastaria consultar o mapa-múndi que se encontrava em Lisboa, na posse de Pêro Vaz da Cunha (Bisagudo), no qual a mesma estaria desenhada, ressalvando não obstante que se tratava de uma carta antiga, não indicando se a terra era ou não habitada – tal suscitaria vasta polémica a nível da sua interpretação, podendo indiciar a existência de precursores de Álvares Cabral no contacto com aquela região.

Bibliografia consultada

– “A Viagem do Descobrimento – A Expedição de Cabral e o Achamento do Brasil”, de Eduardo Bueno, Editora Pergaminho, 2000
– “Os Descobrimentos Portugueses”, de Luís de Albuquerque, edição das Selecções do Reader’s Digest, 1985
– “O Achamento da Terra de Vera Cruz”, de Jorge Couto, Camões – Revista de Letras e Culturas Lusófonas, número 8, Janeiro-Março de 2000

Nos dias seguintes, ao mesmo tempo que era erigida uma grande cruz, em madeira, destinada a ser facilmente visualizada por futuras expedições, sinalizando o local, colocada na proximidade da foz do rio Mutari, procedeu-se ao reabastecimento de água e aprovisionamento de lenha, enquanto a carga da naveta – a enviar de regresso a Lisboa, comandada por Gaspar de Lemos, com o envio ao Rei, para além da famosa carta, de papagaios, araras, arcos e flechas, cocares e pedras de reduzido valor, assim como do primeiro pau-brasil a chegar à Europa – foi transferida para as restantes embarcações.

No último dia do mês de Abril, quinta-feira, dia 30, os navegantes portugueses haviam novamente deparado com uma pequena multidão, de cerca de 400 a 500 nativos, agora já desarmados, e dispostos a ajudar, ao mesmo tempo que dançavam ao som de um tamborim.

Bibliografia consultada

– “A Viagem do Descobrimento – A Expedição de Cabral e o Achamento do Brasil”, de Eduardo Bueno, Editora Pergaminho, 2000
– “Os Descobrimentos Portugueses”, de Luís de Albuquerque, edição das Selecções do Reader’s Digest, 1985
– “O Achamento da Terra de Vera Cruz”, de Jorge Couto, Camões – Revista de Letras e Culturas Lusófonas, número 8, Janeiro-Março de 2000

Na manhã de sábado, 25 de Abril, as naus entraram então na baía, tendo Pedro Álvares Cabral ordenado a Nicolau Coelho e a Bartolomeu Dias que «baixassem à terra e levassem aqueles dois homens».

Depararam-se com cerca de 200 homens, armados com arcos e flechas, que depuseram a sinal dos portugueses, iniciando-se então os primeiros contactos, com trocas de objectos, com os exploradores a oferecerem aos nativos guizos e missangas, assim como toucas vermelhas, recebendo papagaios e araras.

No domingo (de Pascoela, o primeiro após a Páscoa), para além de o comandante, reunido com os capitães da esquadra, ter decidido enviar ao rei a notícia do achamento, foi celebrada por Frei Henrique de Coimbra a primeira missa cristã em terras sul-americanas, no ilhéu da Coroa Vermelha, participada pela tripulação, a que entretanto acorreram cerca de duzentos índios tupiniquins.

Bibliografia consultada

– “A Viagem do Descobrimento – A Expedição de Cabral e o Achamento do Brasil”, de Eduardo Bueno, Editora Pergaminho, 2000
– “Os Descobrimentos Portugueses”, de Luís de Albuquerque, edição das Selecções do Reader’s Digest, 1985
– “O Achamento da Terra de Vera Cruz”, de Jorge Couto, Camões – Revista de Letras e Culturas Lusófonas, número 8, Janeiro-Março de 2000

Seguindo não muito longe da costa, mas afastando-se dos recifes do Itacolomi (frente à ponta Corumbaú), passariam as falésias de Trancoso e de Porto Seguro.

Após terem percorrido cerca de dez léguas, chegariam então à que viria a ser denominada como “Baía Cabrália”, «um arrecife com um porto dentro, muito bom e muito seguro, com uma mui larga entrada», onde fundearam no final do dia 24 de Abril.

O primeiro encontro efectivo com os indígenas seria então protagonizado pelo piloto Afonso Lopes, que, embarcado num esquife, saíra com a missão de sondar o porto, deparando com dois índios que pescavam, os quais capturou, conduzindo-os a bordo da nau capitânia, onde foram recebidos em festa, conforme meticulosamente descrito por Pêro Vaz de Caminha, sendo-lhes exibidos sucessivamente um papagaio, uma ovelha, uma galinha, pão e peixe cozido, mel e passas de figo… para acabarem por se “encantar” com um mero rosário de contas brancas.

Bibliografia consultada

– “A Viagem do Descobrimento – A Expedição de Cabral e o Achamento do Brasil”, de Eduardo Bueno, Editora Pergaminho, 2000
– “Os Descobrimentos Portugueses”, de Luís de Albuquerque, edição das Selecções do Reader’s Digest, 1985
– “O Achamento da Terra de Vera Cruz”, de Jorge Couto, Camões – Revista de Letras e Culturas Lusófonas, número 8, Janeiro-Março de 2000

Nicolau Coelho dar-lhes-ia instrução para que baixassem os arcos, estabelecendo – para os cativar e manifestar as suas boas intenções – a primeira troca, ao atirar-lhes um barrete vermelho, um sombreiro preto e a carapuça que usava; recebendo dos indígenas um sombreiro «de penas de ave», assim como um colar de contas brancas.

Assim se dava origem ao início do que se tornaria numa aliança de cerca de sete décadas entre os povos lusitano e da tribo Tupiniquim, que em número total de cerca de 85 000, ocupavam o litoral brasileiro, concentrados no sul da Baía e no litoral norte de São Paulo.

Entretanto, na noite de 23 de Abril, uma forte ventania faria afastar os navios portugueses, compelidos a apontar a Norte, visando encontrar uma zona abrigada para ancorar.

Bibliografia consultada

– “A Viagem do Descobrimento – A Expedição de Cabral e o Achamento do Brasil”, de Eduardo Bueno, Editora Pergaminho, 2000
– “Os Descobrimentos Portugueses”, de Luís de Albuquerque, edição das Selecções do Reader’s Digest, 1985
– “O Achamento da Terra de Vera Cruz”, de Jorge Couto, Camões – Revista de Letras e Culturas Lusófonas, número 8, Janeiro-Março de 2000

A primeira tentativa de estabelecer diálogo, por intermédio do envio de um batel, com Nicolau Coelho e Gaspar da Gama (o “judeu da Índia”, que falava árabe, assim como os dialectos hindus), assim como um grumete da Guiné e um escravo de Angola – representando os três continentes até então conhecidos e dominando seis idiomas diferentes – revelar-se-ia infrutífera, devido ao ruído do mar agitado e da rebentação («não pôde deles haver fala nem entendimento que aproveitasse, por o mar quebrar na costa»).

Desse breve e fugidio contacto restava, não obstante, e desde logo, a novidade, para os portugueses, da visão daqueles homens «pardos, todos nus, sem nenhuma coisa que lhes cobrisse suas vergonhas».

Quando o bote em que se fazia transportar a “comitiva exploratória” tocou no fundo de areia, os nativos (dezoito a vinte homens) de imediato se aproximaram, «todos rijamente, trazendo nas mãos arcos e setas».

Bibliografia consultada

– “A Viagem do Descobrimento – A Expedição de Cabral e o Achamento do Brasil”, de Eduardo Bueno, Editora Pergaminho, 2000
– “Os Descobrimentos Portugueses”, de Luís de Albuquerque, edição das Selecções do Reader’s Digest, 1985
– “O Achamento da Terra de Vera Cruz”, de Jorge Couto, Camões – Revista de Letras e Culturas Lusófonas, número 8, Janeiro-Março de 2000

Após 43 dias de navegação, e mais de 6 000 quilómetros percorridos (encontrando-se então a cerca de 17º S de latitude), a 21 de Abril, era avistada no mar uma grande quantidade de «ervas compridas», até que, na manhã do dia seguinte, 22 de Abril, os «fura-buchos» anunciavam o que logo seria visível: terra firme!

Ao entardecer de 22 de Abril de 1500 a expedição ancorava frente ao Monte Pascoal («houvemos vista de terra, a saber, primeira de um monte grande mui alto e redondo e de outras serras mais baixas ao sul dele, e de terra chã com grandes arvoredos, ao qual monte alto o capitão pôs o nome de monte Pascoal»), a cerca de 20 milhas da costa.

Na manhã seguinte, ancorando a apenas cerca meia légua da praia (foz do que viria a ser denominado rio do Frade), estabelecia-se o primeiro contacto visual entre os exploradores lusos e os nativos da nova terra agora descoberta.

Bibliografia consultada

– “A Viagem do Descobrimento – A Expedição de Cabral e o Achamento do Brasil”, de Eduardo Bueno, Editora Pergaminho, 2000
– “Os Descobrimentos Portugueses”, de Luís de Albuquerque, edição das Selecções do Reader’s Digest, 1985
– “O Achamento da Terra de Vera Cruz”, de Jorge Couto, Camões – Revista de Letras e Culturas Lusófonas, número 8, Janeiro-Março de 2000

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