Capítulo VI
Do modo do comer e beber dos Japões
1
Nós comemos todas as cousas com a mão;
os Japões, homens e mulheres, desde crianças,
comem com dous paus.
2
O nosso comer ordinário é pão de trigo
Os Japões arroz cozido sem sal.
3
As nossas mesas estão antes que venha o comer
postas;
as suas vêm juntamente com o comer da cozinha
4
As nossas mesas são altas e têm suas toalhas
e guardanapos;
as dos Japões taboleiros vruxados, quadrados, rasos,
sem guardanapo nem toalha.
5
Nós assentamo-nos em cadeiras para comer com
as pernas estendidas;
eles sobre os tatamis ou no chão com a pernas
encruzadas.
6
As suas ou todas juntas – ou em três mesas;
as nossas iguarias vêm poucas e poucas.[…]
11
Os homens em Europa comem ordinariamente
com suas mulheres;
Em Japão é cousa mui rara, porque também as mesas
são divisas.
12
A gente de Europa se deleita com pexe assado e
cozido;
Os Japões folgam muito mais de o comer cru.[…]
21
Nós lavamos as mãoes no princípio e fim da mesa;
Os Japões, como não põem a mão no comer, não
têm necessidade de as lavar.[…]
26
Antre nós se esfria o vinho;
Em Japão, pera se beber, quasi todo o ano se
aquenta.
27
O nosso vinho é de uvas;
o seu é todo de arroz.
28
Nós bebemos com uma mão;
eles sempre bebem com duas.[…]
38
Antre nós é grande injúria e descrédito embebedar-
-se um homem;
em Japão se prezam disso e perguntando:
‘Que faz o Tono?’ dizem: ‘Está bebâdo’.[…]
41
Nós fugimos de cães e comemos vaca;
eles fogem da vaca e comem lindamente os cães
por mezinha.[…]
(via “História e Antologia da Literatura Portuguesa – Século XVI – Literatura de Viagens – II” – Fundação Calouste Gulbenkian, Boletim nº 23, Dezembro de 2002 – a partir de “Europa/Japão – Um Diálogo Civilizacional no Século XVI”, Apres. de José Manuel Garcia; Fixação de texto e notas por Raffaella D’Intino, Lisboa, CNCDP, 1993)