Se chega novamente algum hóspede à casa dalgum seu amigo ou parente, se o dono da pousada não está vestido de festa, entrando o hóspede nenhuma menção nem conta faz dele até mandar trazer vestidos festivos e calçado. E depois de vestido e calçado vai-se ao hóspede e recebe-o com grandes gasalhados e cortesias, porque têm que não convém que novo hóspede e de obrigação se receba com vestidos e trajos comuns, senão que vestido de festa o agasalhem, porque nisto lhe mostra[m] que sua entrada em sua casa é dia de festa para ele[s].

Qualquer pessoa ou pessoas que chegam a qualquer casa de homem limpo, têm por costume oferecerem-lhe em uma bandeja galante uma porcelana, ou tantas quantas são as pessoas, com uma água morna a que chamam chá, que é tamalavez vermelha e mui medicinal, que eles costumam a beber, feita de um cozimento de ervas que amarga tamalavez. Com isto agasalham comummente todo género de pessoa[s] que têm algum respeito, quer conhecidos quer não, e a mim ma ofereceram muitas vezes.

São os chinas mui comedores e comem muitas iguarias. Comem a uma mesa peixe e carne, e a gente baixa às vezes guisa tudo junto. As iguarias que se hão-de comer a uma mesa todas juntas se põem à mesa, para que cada um coma do que mais lhe agradar. A gente limpa e nobre tem muita polícia em seu trato, conversação e trajo. Tem a gente comum algumas coisas grosseiras.

(via “História e Antologia da Literatura Portuguesa – Século XVI – Literatura de Viagens – II” – Fundação Calouste Gulbenkian, Boletim nº 23, Dezembro de 2002 – a partir de “Tratado das Coisas da China”, Introd., modernização do texto e notas de Rui Manuel Loureiro, Lisboa, Edições Cotovia, 1997)